A questão do tempo de serviço a recuperar dos professores
Para a crónica semanal de hoje hesitei entre este tema atual e um outro mais filosófico decorrente de uma pergunta de uma colega filosofia de quais os argumentos para ser contra o facilitismo. Sem prejuízo de voltar a este último de forma sistemática, cada post tem argumentos das razões para combater o facilitismo, ainda que não sistematizados.
Voltando à atualidade, na votação do OGE2019 o CDS, PCP, PSD e BE forçaram o governo a voltar às negociações com os professores para negociarem o modo de recuperação do tempo integral.
Em primeiro lugar falou-se de coligação negativa, que já é uma forma de desvalorizar esta decisão, pois estes partidos foram coerentes com as suas posições anteriores e portanto era expectável. Aqui faltou humildade ao governo na previsão de que este resultado podia acontecer - volto mais à frente à problemática da falta de humildae. Em segundo lugar os opinion makers do PS, nomeadamente o irmão do 1º ministro, Ricardo, aparecereu a dizer que isto era uma consequência da tróica, numa tentativa de colocar o ónus no PSD/CDS, esquecendo-se de referir que este congelamento começou em 2005, num governo PS de que o irmão fazia parte. O PS tem culpa de parte deste descongelamento.
O argumento maior para o governo não concretizar este descongelamento é o seu custo. Mas o interessante é que não são apresentadas as contas, mas um número final, de 600 milhões de euros, que seriam divididos por vários anos em função da negociação a realizar e não tudo de uma só vez como quer fazer passar para assustar os portugueses. As contas que levaram a este montante são segredo de estado, não havendo transparência na prestação da informação, o que por si só é uma atitude que faz desconfiar, porque se o número fosse credível, nada custaria torná-lo público. Além disso este número, na blogosfera já foi desmontado como (muito) sendo excessivo, porque ignora pelo menos os estrangulamentos na carreira e os impostos adicionais a que vão dar origem, pelo que se deveria contabilizar o esforço líquido financeiro de impostos, o que não é o caso. Ou seja, é um pouco como a ilusão monetária, que corresponde à perda de poder de compra sempre que não há atualização dos rendimentos ao nível da inflação para o salário real se manter inalterado. Com a inflação o governo utiliza a ilusão monetária para diminuir custos com salários reais, ao passo que na previsão de gastos com os professores aumenta os gastos ao esquecer-se de descontar o retorno atravês dos impostos diretos a mais que vão ser cobrados. Neste aspeto o governo aje como ilusionista.
Por outro lado, o governo parece ter «personalizado» este debate no sentido de se manter orgulhoso e arrogante na sua posição, fazendo deste debate um finca pé que não acontece em nenhum outro dossier. Acho mesmo que ao aproximarmo-nos do fim da legislatura e com o PS próximo da maioria absoluta se começa a notar esta falta de humildade e a transparecer o orgulho e a arrogância.
Um último reparo, em tempos foram criadas as carreiras dos corpos especiais da função pública em que se reconhece a certas profissões um estatuto especial pelo seu contributo para o desenvolvimento do país que é uma forma de se atribuir estatuto social. Agora estamos perante uma alteração unilateral destas carreiras procurando equipará-las às carreiras ditas normais, o que é uma forma subtil de desvalorizar socialmente e monetariamente estas carreiras. Seria mais honesto avançarem com a revisão dos estatutos como acontece com os juízes e enfermeiros em vez de o fazerem à socapa com os professores. Sejam frontais, não façam baixa política, no sentido de ter objetivos encapotados por receio de as sua políticas não passarem na AR.
Concluindo, há uma janela de oportunidade para se resolver este problema criada pela Assembleia da República, mas desconfio das boas intenções do governo pela forma como se comportou até agora.