Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

CONTRAOFACILITISMO

Blog para debater ideias que recusem o facilitismo em educação.

CONTRAOFACILITISMO

Blog para debater ideias que recusem o facilitismo em educação.

Ainda a propósito do sucesso a 100% até ao 9º ano.

vai-teaosprofessores, 27.11.19

O SE Costa brindou-nos, referindo-se a este tema, num artigo de opinião com o seguinte argumento:  «o propósito economicista não encontra respaldo no investimento continuado em medidas de apoio à diminuição da retenção: só na última legislatura, foram contratados mais de 300 psicólogos, alocadas dezenas de milhares de horas da componente letiva a tutorias, reforçadas as equipas docentes para os planos de ação do Programa Nacional para a Promoção do Sucesso Escolar em cerca de 800 professores, aumentado o crédito horário das escolas TEIP (…), mobilizados 100 milhões de euros dos fundos comunitários em projetos de combate ao insucesso.»

O problema é que o que nos diz é uma gota de água no oceano para as necessidades de uma política séria de combate ao insucesso escolar. A título de exemplo na escola onde leciono, os meios disponibilizados só permitem que haja coadjuvação, nas disciplinas com exames, uma vez de 15 em 15 dias. Isto significa, que nas disciplinas de 4 horas haverá dois professores na turma em 1/8 das aulas, nas disciplinas com 5 horas haverá 2 professores na turma em 1/10 das aulas e assim sucessivamente. Isto é a oferta pública, a oferta privada, aqui apresentada como contraponto à oferta pública, as ditas explicações, têm no mínimo 3 horas por semana, ou seja há um reforço educativo de pelo menos 75% (3/4) para as disciplinas de 4 horas semanais, baseadas na relação de um professor para seis alunos (exemplo que conheço). Quanto às tutorias, tenho-as pedido mas não têm sido atribuídas.

Assim, o que o SE Costa ofereceu à minha escola foi uma migalha comparando com a procura da solução privada, as explicações.

O que está errado é a partir desta migalha se exigir o sucesso a 100% até ao 9º ano. Direi mais estamos no campo da demagogia. Nem sequer se pode falar em copo meio cheio, nesta analogia deve-se falar em copo quase vazio ou numa migalha.

Além disso, quero dizer que tenho 2 horas semanais na sala de estudo, o que não é novo no sentido que não foi instituído por esta equipa ministerial, mas sem alunos. Aqui podia-se aproveitar melhor estas horas. Portanto, em termos de organização podemos melhorar para responder ao problema do insucesso.

Concluindo, o sucesso a 100% até ao nono ano com os atuais meios disponibilizados é pura demagogia e uma forma de pressão sobre os professores.

O Estado social, a degradação da educação e a opinião pública.

vai-teaosprofessores, 13.11.19

O estado social é um conceito que significa que o Estado promove medidas que garantam o acesso à educação, à saúde e segurança social, como forma de reduzir desigualdades e promover igualdade de oportunidades. É um elemento caraterístico do modelo europeu.

Quando o Estado não assegura a educação de forma eficiente são os mais desfavorecidos que saem a perder, na medida em que os que têm rendimentos podem sempre escolher os privados. Enfraquecer o estado social é promover os negócios privados na educação e saúde.

Desde a intervenção da troica que houve desinvestimento no estado social. Na saúde tem passado para a opinião pública esse desinvestimento, com os problemas nas urgências. Na educação, depois de uma fase em que houve intensificação do trabalho dos professores, mesmo sem alteração do horário, com a passagem de trabalho não letivo para trabalho com alunos, que devia ser letivo. Ou seja, com os outros funcionários públicos houve redução da jornada de trabalho para as 35 horas, mas com os professores não houve desagravamento da intensificação do trabalho. A preocupação com o défice está agora a criar constrangimentos ao nível dos funcionários e de turmas sem alguns professores.

O que interessa realçar é que os constrangimentos orçamentais impostos para se obter o saldo orçamental nulo começa a ter consequências na educação, ao nível da falta de funcionários e da falta de professores. Pela avalanche de casos não são problemas residuais. Começa também a opinião pública a tomar consciência das consequências desta política, que até agora estava camuflada pela intensificação do trabalho dos professores e por isso pelo agravamento do burnout entre os docentes, consequência com pouco impacto mediático por só afetar os professores.

Numa conjuntura de insuficiência de recursos para promover o estado social a meta de taxa de retenção nula no ensino básico só pode ser conseguida administrativamente. Claro que os professores desejam ter 100% de sucesso, mas sem baixar o nível de exigência, pelo que a taxa de retenção nula é desejada se apoiada em mais recursos, traduzidos em turmas mais pequenas, mais coadjuvação e mais apoio. Como não há dinheiro e já há falta de professores, só resta a via administrativa!

Outro problema que aparece agora na opinião pública é a da agressão a professores e funcionários. Aqui estão em causa vários fenómenos. Um deles é a atitude parental de super proteção aos filhos únicos. Outra é a degradação social da condição de professor que o torna um alvo mais fácil, consequência dos ataques à classe desde a MLR/Sócrates, que se traduziu na degradação do exercício da profissão com mais burnout e degradação salarial, o que leva a menor respeito social. A diminuição das taxas de retenção também se traduziu em mais indisciplina por estramos a premiar com pseudo sucesso alunos indisciplinados e, portanto, a reforçar tais comportamentos. Alguns pais não compreendem as passagens administrativas se os seus filhos não estão comtemplados. Alguns pais não entendem a necessidade de regras sociais quando aplicadas aos seus filhos. Daí as agressões. Fala-se em endurecer as penas a polícias e bombeiros agredidos, mas ninguém fez uma proposta sobre professores.

Concluindo, o ministro cientista começa a sentir na pele o que aceitou fazer, gerir a educação sem meios, mas teimando em prosseguir uma política para diminuir a retenção, a degradação da condição de trabalho e de vida dos professores, traduzida nas medidas universais e numa forte pressão para se implementar as passagem administrativas, argumentando que mesmo sem recursos «haverá oportunidade de recuperar as aprendizagens mais à frente no percurso do aluno». Mas o que se passa é estarmos a premiar a indisciplina, o absentismo e o desinteresse, tudo em nome da escolaridade obrigatória (será necessária?) e da flexibilidade (igualdade de oportunidades não é facilitismo). Temos estado a adiar a resolução dos problemas e eles começam a emergir e a passar para a opinião pública. A responsabilidade é sua Sr. Ministro e não a passe para outros: professores e diretores (como ontem fez na questão dos funcionários).

Ainda a questão da gestão escolar a propósito da influência dos diretores na motivação dos professores.

vai-teaosprofessores, 06.11.19

O Alexandre Henriques fez aqui no Com Regras uma referência ao artigo do Público  de segunda feira 4/11 sobre a influência decisiva na motivação de professores em https://www.comregras.com/a-relacao-diretor-professor-e-tao-importante-como-a-relacao-professor-aluno/.

Quem me segue sabe que esta tem sido uma das bandeiras das minhas opiniões: a gestão escolar é um fator decisivo para a existência de práticas democráticas nas escolas. Tenho posto o acento tónico na necessidade da escola ter práticas democráticas como exemplo e como preparação para a vida adulta e também como forma de combater o absentismo eleitoral que tem vindo a crescer.

O estudo da Faculdade de Psicologia da Universidade do Porto aborda o estilo de liderança e sua influência na motivação dos professores e encontrou uma «correlação positiva entre a forma como são geridos os estabelecimentos de ensino e a relação que os docentes têm com a profissão, no sentido de os professores vestem mais a camisola se a liderança da escola for ética».

É dito também que «a liderança despótica está negativamente correlacionada com o compromisso dos docentes».

A diferença de abordagem deste estudo da minha análise centrada na necessidade de práticas democráticas leva a conclusões diferentes, os autores do estudo propõe condições de acesso ao cargo de diretor, enquanto a minha solução é o regresso à democracia direta e a eleição de um órgão colegial.

Contudo, acho importante a divulgação do dito estudo que é mais um alerta para as práticas despóticas que se têm vindo a generalizar-se nas escolas.

Tenho evitado referir-me a experiências pessoais, mas é oportuno neste contexto referir que há alguns anos atrás escrevi uma carta aberta e na sequência da mesma tive um processo disciplinar, o que demonstra o clima antidemocrático de intimidação e tentativa de calar pensamentos alternativos e diversos. Este exemplo é demonstrativo de que nem sequer a alternativa é tolerada por certos diretores.

Depois temos aqueles casos mais comuns como castigar um professor ou professores com maus horários e com sobrecarga de trabalho em virtude de ousarem pensar de forma diferente. Para não falar em vaidades ou soberbas como o único carro a entrar no recinto escolar ser do diretor!

Concluindo, o artigo do Público levanta um tema pertinente, mas é tímido na solução, pois não basta impor condições de acesso ao cargo de diretor é preciso introduzir uma verdadeira democracia como forma de preparar os discentes para a prática democrática e de promover uma escola aberta ao debate que impeça práticas despóticas, como perseguir a opinião diversa. A democracia pode não impedir totalmente práticas despóticas mas cria sistemas de contrabalanço às mesmas que  as tornam a exceção e não a regra como tende a acontecer com o atual modelo. É aqui que acho insuficiente a conclusão do estudo, pois criar «condições de acesso ao cargo» parece-me muito pouco.